10 de outubro de 2015

A Web está morrendo?

Lembro quando meu pai comprou um computador novo, lá no final da década de 90, e o vendedor empurrou um monte de coisa, uma delas foi um modem US Robotics. Eu era criança, meu inglês era uma bosta e não entendi muito bem para que servia olhando a caixa. Mas pelo pouco que entendi, era alguma coisa de conectar computadores. Então questionei meu pai (já que ele comprou aquela merda e estava parado há meses) e ele descobriu que, além de manda fax, dava para conectar a um servidor BBS  (bulletin board system).

Foi Mágico™. Aquele terminal com fundo preto e caracteres coloridos fazia me sentir em Hackers, conversando com gente de todo mundo através do BBS do Mandic. Dava até para ver o horóscopo, jogar xadrez etc. Era tipo uma deepweb para molecada.



Mas eu sentia que ainda tinha algo mais, que dava para fazer mais coisas.

No desktop do Windows 95 eu ficava encucado com aqueles ícones "Connect to the Internet", "Set Up The Microsoft Network", "Internet Explorer", "Outlook Express" etc.


Aí foi então que algo além de Mágico™ aconteceu, algo Dyvino™: não sei o que eu fiz que consegui acessar a Interwebs. Sim, Interwebs. A Internet é apenas o sistema que usa o TCP/IP para se conectar ao mundo. Mas a Interwebs (www, web ou http, que seja), é a página, é o conteúdo, é onde as coisas acontecem, onde o filho Chola™ e SuaMãe. Um mundo novo, um mundo mágico. Acessar páginas hospedadas mundo a fora, feitas por pessoas que você nunca viu sobre assuntos que não imaginava.


Qualquer um podia criar uma página, um blog como esse. Bastava pegar o Microsoft FrontPage ou então o Netscape Composer, arranjar um lugar para hospedar (ou hospedar na própria máquina) e voilá, compartilhava o que quisesse, como mágica!

Os protocolos e blablabla começaram desde a década de 60, mas a Interwebs, ou WWW (World Wide Web) começou com o CERN para os centros de estudos trocarem informações sobre o ambicioso projeto Large Hadron Collider. Bagulho deu tão certo que acabou se espalhando pelo mundo. Lembro vagamente, na época, muitos chamando o CERN de inútil, que o LHC iria explodir o planeta etc. Mais uma prova da importância da ciência, pois as ferramentas para atingir o objetivo das pesquisas acaba espirrando em outros grandes projetos.

Enfim, estava consolidado o WWW usando protocolo http. Muita gente compartilhava informações e documentos pelo pop3, telnet, ftp e afins, mas foi o http que trouxe um conteúdo mais interativo, mais bonito, pans e tal.

A Internet não parava (e ainda não para) de crescer e cada dia mais apareciam novas páginas, conteúdos... até que os dispositivos móveis surgiram e começaram a se popularizar. Como acessar a Interwebs pela tela minúscula do celular? Do PDA?

No começo criaram o Wireless Application Protocol (WAP) que basicamente era um padrão para acessar alguns serviços como email, web, news etc usando dispositivos móveis. Se você acha o layout do Meditabundamente zuado, imagina então um site "wap". 


Era muito ruim. Além de ser lerdo, era muito feio. Então eis que a Apple lança o iPhone como Safari, um browser que dava para navegar em sites normais com uma experiência relativamente boa. A Interwebs já estava consolidada e, com isso, parecia que nada podia pará-la.

Poucos applefags sabem, mas quando o primeiro iPhone foi lançado em 2007 ele não tinha Appstore, que foi lançada no iOS 2 em 2008. Ou seja, ele tinha apenas os apps de fábrica. Nem a própria Apple, no começo, apostava em apps de terceiros.

O que toda essa merda tem a ver com a morte da Interwebs?

Alguns anos atrás eu li que os apps estavam matando a web. Tentei pesquisar e lembrar quais e encontrei um do Wall Street Journal, falando que, por exemplo, passamos 86% do tempo em apps e o restante no browser. Mas se pesquisar mais dá para achar outros, como no GigaOm em 2012 e VentureBeat em 2013.

Com a popularização dos apps, as pessoas passaram a acessar mais o conteúdo através deles. Para ler um email, tem o app. Para acessar o facebook, tem o app. Twitter, app. Notícias, app. Previsão do tempo, app. Ou seja, a maioria estava acessando o conteúdo por apps, não pela Web. Virou uma febre criar apps, seja porco ou bem trabalho.


O acesso móvel não parava de crescer e manter duas plataformas (apps e web) é caro. Com o acesso móvel aumentando e a web caindo, obviamente as empresas passariam a focar nos apps. Por mais prático que seja um app, porra, não dá para comparar com aqueles browsers maravilhosos. Parecia que a Web estava com os dias quase contados.

Por mais que polarizado seja o mundo dos mobiles (iOS e Android), ainda tinha o Symbian, BBOS, Windows Phone etc. Você acabar ou limitar sua plataforma na web para criar um app para o iOS vai foder com os outros. Por mais piada que o John Chen, CEO da Blackberry, virou na internet ao falar da "neutralidade dos apps", até que tem um fundo de verdade. Por exemplo, em alguns países o WP tem um marketshare de 20.. 30%. Não é pouca bosta e você cagar para eles chega a ser esnobe. 

Não falo isso porque tenho um Windows Phone falta apps. Eu tenho um iPad e uso ele caso eu preciso usar algum app que não tenho no celular. Mas mesmo assim eu acabo preferindo usar a browser do próprio celular ou do computador. Não sei se é porque sou da geração da tretas entre browsers ou sei lá. Mas eu prefiro fazer tudo nele. E é algo acessível a todos, não importa a plataforma. Um site, com layout móvel ou não, vai abrir em qualquer lugar. Já um app, não.

Então a morte da Web traria consequências apocalípticas.

Algum tempo depois o Slate publicou uma matéria contestando o WSJ. A Interwebs não está morrendo, ela está mudando. Ou seja, que não se pode considerar a Web apenas o que está sendo renderizado no browser, mas sim sendo transmitido pelo http/https.  Muitos apps usam esse protocoloco, principalmente quando você está lendo um conteúdo no facebook, twitter etc e abre um link para acessar um conteúdo externo. E também a questão semântica, de que a Web estava associada ao HTML/CSS/JS etc. Nesse caso eu até concordo.

Mas a questão ainda é a porra do browser. Do que adianta acessar um conteúdo http que só é acessível por um app que só existe em uma plataforma?

A Microsoft ficou para trás e aprendeu dolorosamente. Tanto é que está criando o Universal Windows Platform com seus "Bridges", que vai trazer apps do Android e iOS para o Windows 10. Além deles, tem o Hosted Web Apps, que é transformar uma página em app e usar as APIs. Considerando que ela domina o mercado com o Windows 10, aí que mora o perigo, dos desenvolvedores darem mais importância em criar um conteúdo para rodar nisso e cagar na experiência em outras plataformas.

Outra ameçada é o Mark Zuckerberg, querendo criar uma nova Interwebs dentro da Internet, com aquele Internet.Org. Mas esse é assunto para outro post.

Então é isso, amiguinhos, não vamos deixar a Web morrer. Porque ela é democrática. Ela é foda.


*Esse texto foi escrito sob efeito de álcool.